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Na primeira parte desse artigo foquei na parte mais doutrinária do culto. De forma resumida mostrei que existe sim uma forma correta de cultuar a Deus, e que sim, Ele se importa muito com essa maneira. Maneira essa que está revelada somente nas Escrituras, de onde retiramos o conceito de princípio regulador do culto. Essa é a nossa base para responder de forma mais prática como deve ser um culto de jovens. E é isso que faremos nessa segunda parte. Como Deus deseja que o adoremos? Quais são os elementos de culto autorizados pela Palavra de Deus? Como podemos aplicar o princípio regulador em nossos cultos de jovens? Espero responder essas perguntas de forma resumida e oferecer um guia simples para todo e qualquer culto de jovens.

É bom lembrar que tudo o que escreverei a partir de agora não é uma mera opinião pessoal. Lembre-se que estou afirmando que, no culto, não há liberdade do tipo “podemos fazer o que quisermos”. Minha preocupação é com o que a Bíblia requer. Precisamos sempre lembrar que a adoração ao Deus santo só pode ser feita da maneira santa que foi planejada pela mente santa do próprio Deus. Portanto, vamos começar mostrando quais são os santos elementos de culto que estão autorizados em sua santa Palavra.

…a adoração ao Deus santo só pode ser feita da maneira santa que foi planejada pela mente santa do próprio Deus.

Elementos de culto

Mark Dever tem, repetidas vezes em seus livros e palestras, afirmado os cinco elementos de culto dessa forma: “ler a Palavra, pregar a Palavra, orar a Palavra, cantar a Palavra e ver a Palavra” (DEVER, Igreja Intencional). Esse é o padrão que, principalmente as igrejas reformadas, tem usado ao longo da história. É um bom padrão para usarmos, mesmo que ainda possa deixar algumas dúvidas. Todos esses elementos estão presentes de forma clara no Novo Testamento e juntos, formam o princípio que deve regular a liturgia de todos os cultos a Deus.

Ler a Palavra:  A carta pastoral de Paulo a Timóteo é de grande ajuda nesse assunto. Nela encontramos o direcionamento de Paulo para que a Palavra seja lida em público: “Até a minha chegada, dedique-se à leitura pública da Escritura…” (1 Tm 4.13).Essa era a prática comum nos cultos nas sinagogas, onde a Palavra era lida e também explicada. Foi isso que Esdras fez num dia especial de adoração pública onde todo o povo se reuniu em praça pública para ouvir a leitura da lei de Deus (Neemias 8). A famosa frase de Jesus “não só de pão viverá o homem, mas de toda Palavra que procede da boca de Deus” (Mt 4.4) indica que a Palavra é o alimento do crente, portanto, deve fazer parte da dieta do culto. Dever lembra algo importante:

“Separar tempo, no culto de domingo de manhã, para ler as Escrituras em voz alta, a cada semana, sem comentá-las, expressa o valor que tributamos à Palavra de Deus. Mostra que estamos ávidos por ouvir a Palavra do Senhor – nós a desejamos.” (DEVER, Igreja Intencional)

Qual foi a última vez que você viu um momento dedicado especialmente no culto de jovens só para ler uma passagem ou capítulo inteiro das Escrituras? Essa é um elemento importante que precisamos retomar.

Pregar a Palavra: Creio que não dúvidas sobre a presença da pregação no culto. O livro de Atos é uma demonstração da expansão do evangelho através da pregação. Podemos ver o destaque que Lucas dá a esse elemento sempre que ele faz questão de registrar o conteúdo das pregações de Pedro e Paulo, por exemplo. A continuação do verso de 1 Tm 4.13 é para exortação e ensino, o mesmo que Paulo ordena em 2 Timóteo 4.2 quando diz “prega a Palavra”. E aqui está algo que vale a pena ser discutido: a forma e conteúdo da pregação. A ordem é para pregar a Palavra. O culto não está centrado na Palavra quando o pregador está centrado em seus próprios pensamentos ou pensamento ideológicos e filosóficos de outro ser humano. A pregação deve ser da Palavra e a melhor forma para isso é o sermão expositivo. Podemos defini-lo assim:

Orar a Palavra: Esse elemento está na mesma situação da leitura. Nós oramos no culto, mas talvez ainda falte aquele momento dedicado de oração. E oração bem baseadas na Palavra. O segundo capítulo de 1 Timóteo nos instrui sobre a adoração corporativa. Ele começa da seguinte maneira: “Antes de tudo, recomendo que se façam súplicas, orações, intercessões e ação de graças”. O fato de Jesus citar Isaías ao dizer “a minha casa será chamada casa de oração” também chama a atenção para esse elemento. Dever sugere orações de adoração, confissão, agradecimento e súplicas. Meu conselho é: separe um tempo para uma oração formal. Convide um jovem antecipadamente para orar. Peça que ele prepare a oração escrita e a sature com a Palavra de Deus. Tente harmonizar a oração com a pregação ou ocasião. Por exemplo: no próximo sábado teremos nosso último culto do ano, então, convidarei alguém para uma oração de ação de graças.

Cantar a Palavra: Acredito que nenhum jovem questione a presença do canto no culto. O problema que temos hoje é exatamente a idolatria da música e as formas erradas em que ela é utilizada. Por isso vou gastar algumas linhas a mais nesse ponto. O texto bíblico que deixa esse elemento claro é o de Efésios 5.19: “falando entre si com salmos, hinos e cânticos espirituais, cantando e louvando de coração ao Senhor”. Isso não quer dizer que louvor e adoração naquela época estavam ligados a música como hoje. Mesmo assim posso dizer que cantar louvores a Deus é parte importante do culto e deve ser uma prática preservada. Assim como na pregação é importante lembrar que precisamos cantar a Palavra. Toda música precisa estar em harmonia com a boa teologia. Em minha opinião, baseada nos Salmos, doxologias e orações de louvor presentes na Bíblia, as melhores músicas são aquelas que exaltam os atributos do Deus Trino e o evangelho. Por outro lado, todas as que exaltam o homem devem ser evitadas.

Como usar a música no ministério de jovens? Além da letra das músicas precisamos lembrar de outros aspectos. Em primeiro lugar, no louvor o ato de cantar é o mais importante (Ef 5.19; Cl 3.16). Nesses dois versos neotestamentários encontramos o foco no canto. Portanto, as vozes tanto do grupo de louvor, quanto de toda a congregação de jovens deve ser valorizada. O foco nos instrumentos e o volume mais elevado deles pode atrapalhar o canto. Em segundo lugar, o canto é congregacional. A igreja foi chamada a cantar junta. As músicas, com seus ritmos e tons, devem permitir que toda a igreja cante junta. O grupo de louvor deve apenas guiar e facilitar o canto congregacional. Jovens não podem ir ao culto para assistir uma apresentação musical. O foco no ministro de louvor ou na banda é prejudicial. Quando todas as luzes estão no palco e a igreja fica escura isso já é um grande indício dessa troca de prioridades. E um terceiro direcionamento, a música não pode fugir daqueles dois conceitos que Deus gosta: decência e ordem. O louvor deve ser alegre, mas sempre mantendo a decência e ordem. Deus não aprova a bagunça e as loucuras dentro do seu culto.

“A voz coletiva do seu grupo de jovens cantando louvores a Deus é o mais importante instrumento musical em qualquer tempo da adoração… A voz coletiva do povo de Deus é o instrumento primário em qualquer reunião de adoração… Cantar é uma ferramenta dada por Deus e uma oportunidade de tornar nossos jovens profundamente enraizados no evangelho” (Tom Olson. Gospel Centered Youth Ministry, p. 143)

Ver a Palavra: Acredito que você se perguntou “como assim ver a Palavra”. O elemento visual, digamos assim, está nas ordenanças, ou seja, na ceia do Senhor e no batismo. Essas foram as maneiras pelas quais Deus decidiu dramatizar ou encenar o evangelho. Podemos dizer que as ordenanças são o teatro autorizado por Deus para o culto público. A ceia foi instituída por Cristo (Lc 22.19) e Paulo a tratou de suas normas como elemento de culto (1 Co 11.20-29). Esse é o memorial da obra expiatória de Cristo. O batismo também foi instituído como prática da igreja por Cristo na grande comissão (Mt 28.29) e temos vários exemplos de batismos em Atos. As cartas de Gálatas e de Romanos também falam da simbologia teológica do batismo. Por ser caráter normativo, visual e didático o batismo, mesmo que não esteja “preso” ao culto, pode ser considerado um elemento autorizado da adoração pública. Não entrarei em muitos detalhes nesse ponto. O motivo é esse: Considero que as ordenanças devem ser feitas publicamente por toda a congregação na presença de pastores e presbíteros. Portanto, por mais que não seja proibido creio ser melhor esperar que toda a igreja esteja reunida para o momento de ceia e batismo.

Um ponto importante aqui é que a ceia e o batismo são os únicos elementos visuais ou “teatrais” claramente citados como prática da igreja. No ambiente de culto creio não caber as práticas de teatro e dança. Nesse último ponto sou totalmente contrário ao conceito de dança litúrgica. Fora do culto creio que o teatro possa ser usado para evangelismo, assim como a dança sendo expressão de arte, mesmo que eu prefira não utiliza-la. Sei que aqui entro em conflito com muitos jovens, mas este é o meu ponto. Pense nisso não pelo seu gosto, mas biblicamente.

Em resumo, parece realmente que esses são os elementos encontrados nos cultos da igreja primitiva. Em Atos 2.42-47 encontramos: “ensino dos apóstolos”, “partir do pão” (ceia), “orações” e “louvando a Deus”. Também encontramos nessa passagem uma referência às ofertas para o sustento da igreja. Como prática bíblica as ofertas estão incluídas na vida de adoração dos cristãos e o culto é um bom momento para fazer isso de forma pública. Também considero o momento de ofertas como mais adequado para o momento onde toda a igreja está reunida, não recomendado para o culto de jovens, a não ser em ocasiões especiais e justas. Ainda poderíamos falar das práticas de confissões de pecado e de fé (que podem estar incluídas nas orações).

Dito isso posso afirmar que um culto de jovens deveria ter os seguintes elementos:

  • (1) leitura pública da Palavra
  • (2) cânticos de louvor
  • (3) oração pública
  • (4) pregação.
  • (5) cântico de encerramento

Não existe uma regra de ordem dos elementos, mas ai está uma sugestão de ordem que já estamos acostumados e que considero boa (o cântico de encerramento é uma sugestão pessoal, pois a pregação da verdade deve nos levar ao louvor). Não podemos esquecer que todo culto, de jovens ou não, deve ser alegre! Estamos cultuando ao Deus Criador e redentor. Nossos corações devem estar cheios de santa alegria ao cultuarmos ao Senhor!

Princípio regulador moderado

Até aqui, desde a primeira parte, tenho defendido o princípio regulador do culto (PRC). Depois dessa parte mais prática chegou a hora, então, de um esclarecimento necessário sobre o meu ponto de vista. Vou usar as palavras “radical” e “moderado” para fins didáticos. Posso dizer então que defendo um PRC moderado em comparação com o PRC radical (não uso essa expressão como pejorativa). Vou exemplificar para entendermos a diferença. O PRC radical toma se preocupa mais com os detalhes práticos e até matérias que estão ou não descritos na Bíblia. Por exemplo, algumas igrejas não usam instrumentos, ou restringem o uso somente a aqueles que são citados em alguma parte da Bíblia. Outras igrejas são cantam os salmos ou textos retirados diretamente das Escrituras, não permitindo novas composições. Poderíamos citar outros exemplos, mas creio já ter sido suficiente.

Não sigo essa linha de pensamento. Para mim, como o nome já diz, o PRC trata-se de princípios, não de regras detalhistas. Minha leitura moderada me leva a considerar apenas os elementos que a Bíblia considera, mas permite uma liberdade submissa aos princípios bíblicos de culto que regem os elementos. Vamos para o exemplo dos instrumentos e músicas. Já toquei nesse assunto acima e vamos aplica-lo agora. Se o foco está nas vozes e os instrumentos estão em harmonia, servindo como fundo musical para ajudar a congregação a cantar, não vejo esse princípio proibindo instrumentos, até mesmo uma bateria. Da mesma forma, se tal música é composta por uma letra bíblica que adore a Deus como Ele, edifique os irmãos no evangelho e seu ritmo seja acompanhado pela congregação em decência e ordem, não há porque proibi-la. Se seguirmos bem os princípios nossa liberdade estará adorando a Deus corretamente.

Contextualização do culto

Então podemos contextualizar o culto e até fazer um culto de jovens de certa forma diferente do culto de domingo? Sim. Eu afirmei que o culto de jovens não tem necessidade e nem liberdade para ser diferente. Isso é verdade dentro dos elementos e princípios de culto, mas não exclui diferenças em aspectos secundários e detalhes. Vejamos como isso pode acontecer:

Na música: No louvor as músicas devem ser escolhidas e arranjadas para que a congregação cante. Num culto de jovens, diferente do culto de domingo, a congregação é composta apenas de jovens. Isso significa que eles conseguem cantar e acompanhar músicas com arranjos diferentes, ritmos um pouco mais rápidos e até tons diferentes. Também é importante lembrar das boas músicas que os jovens conhecem e apreciam. Muitas delas podem ser desconhecidas do mais velhos, impedindo que cantem no domingo, mas podem fazer parte do culto de jovens. Embora eu defenda essa contextualização musical, creio que as mudanças não devem ser grandes. Os princípios estão aí para dizer isso.

Na pregação: O conteúdo e a forma de pregação devem ser a mesma. A prioridade da pregação bíblica expositiva deve estar presente também no culto de jovens. O que pode ser contextualizado então. Quem já passou por algum curso ou aula de homilética sabe… A linguagem, as ilustrações e aplicações podem e devem mudar de acordo com o público. Nós pregadores temos a tarefa de tornar a mensagem acessível e penetrante para os ouvintes. No culto de jovens podemos usar uma linguagem (santa) mais jovem e fazer ilustrações e aplicações e façam mais sentido e identifiquem-se mais com a vida dos jovens.

No ambiente: O jovem é mais aberto para a criatividade. Não vejo problema em criar um ambiente com mais cara de jovem. Sei que muitas igrejas erram nesse ponto, criando ambientes totalmente diferentes e descaracterizando a igreja, mas não é por causa disso que devemos proibir que a criatividade dos jovens não possa dar uma mão na hora de preparar um ambiente. Talvez colocar a logo do ministério no fundo do púlpito, ou quem sabe uma decoração simples que aponte para o tema da mensagem. Podemos pensar em coisas simples, que não roubem o foco e que estejam dentro dos princípios (decência e ordem).

Para encerrar essa parte, deixo aqui uma sugestão. Podemos usar o antes de o depois do culto para outras atividades. Que tal planejar uma boa recepção para os visitantes? E o momento de fotos enquanto chegam? Aqui em nossa igreja costumamos usar muito o momento após o culto. Comemos juntos, jogamos alguns jogos de tabuleiro, conversamos e muitos até brincam de esconde-esconde pelo terreno da igreja. Já fizemos até cinema ao ar livre. Podemos usar desses momentos fora do culto para promover uma boa e divertida comunhão.

 

Conclusão

Quero concluir toda essa análise do culto dizendo aos jovens que Deus decretou os fins e os meios. Ele está interessado tanto no resultado final como nos procedimentos para alcançar os resultados. Frases como “eu adoro do meu jeito” ou “cada um que cultue como acha melhor” não honram nosso Deus. Ele nos deu princípios que nos levam à uma pratica santa e regida por Ele mesmo. Pense numa composição musical… Quem define a letra, tom, notas, arranjos e solos é o compositor. No culto, Deus é o grande compositor, autor da nossa fé e Senhor da Igreja.

Isso não significa, como eu já argumentei, que como jovens não temos a liberdade de usar nossa juventude e criatividade no culto. Deus nos criou para isso também. Seguindo seus princípios podemos cultua-lo com nossa identidade jovem! O problema em muitas igrejas é que essa identidade jovem é buscado em padrões mundanos e não bíblicos, tornando a igreja mais parecida com o mundo na justificativa de torna-la mais relevante aos jovens. Se seguirmos o Sola Scriptura e o Soli Deo Gloria não cairemos nesse terrível erro. Seguindo o princípio regulador do culto estamos pisando em liberdade no terreno seguro de Deus. Kevin De Young escreveu um pequeno e excelente texto sobre essa liberdade, sugerindo que o PCR nos liberta do cativeiro cultural, das brigas por preferências, do peso na consciência e para sermos multiculturais e focar no que é central.

Espero que possamos cultuar a Deus de maneira que toda glória seja dada a Ele, e isso só acontece quando todo o culto acontece segundo a sua vontade expressa nas Escrituras. Que Deus nos faça jovens que verdadeiramente cultuam e adoram em espírito e em verdade!

Pedro Pamplona é casado com Laryssa e formado em administração pela Faculdade 7 de Setembro (Fortaleza/CE), pós-graduado em Estudos Teológicos pelo Centro Presbiteriano Andrew Jumper (São Paulo/SP) e estudante do Sacrae Theologiae Magister (Th.M) em Teologia Sistemática do Instituto Aubrey Clark (Fortaleza/CE). Serve integralmente como líder de jovens na Igreja Batista Filadélfia, em Fortaleza.