Isso também não é verdade. Ao contrário de uma hermenêutica (interpretação) que encontra significado no leitor e no mundo do leitor, nós cristãos encontramos o significado e a verdade no autor e no mundo do autor. Não nos importa, portanto, o que a cosmovisão secular de nossa época está tentando empurrar para o texto bíblico. Importa-nos o que o autor inspirado disse. Nesse sentido, o significa bíblico não muda ou evolui de acordo com o progresso da sociedade. Ele foi fixado pelo autor de maneira inicial e única. Nossa hermenêutica não é progressista, mas conservadora. Aqui está outra verdade importante: a igreja não precisa e nem deve mudar suas convicções em relação as relações homossexuais.
Uma tensão complicada
A igreja vive numa linha tênue entre essas duas verdades. Não somos e nem devemos ser homofóbicos e não concordamos e nem devemos concordar com o pecado da homossexualidade. Sim, é pecado (Lv 18:22; Rm 1:26-27; 1 Co 6:9). Como a igreja deve agir então? Essa é uma pergunta importante e que merece atenção. Posso dizer sem medo de exagerar que a maioria de nossas igrejas não sabem como lidar com essa tensão. Por mais que não precisemos pedir desculpas pela violência, creio que precisamos refletir sobre como não costumamos acertar nesse equilíbrio.
Você já pensou o que aconteceria se um casal homossexual entrasse de mãos dadas pela porta da sua igreja? Imagine se eles decidem frequentar os cultos para ouvir a pregação regularmente. Agora me responda. Haveria uma dificuldade diferente para eles ou uma aceitação acima do normal? Como eles receberiam o evangelho, como uma ênfase enorme na acusação do pecado ou com uma ênfase enorme na aceitação e normalidade do pecado? Geralmente transitamos nesses dois extremos. Mas por que não recebê-los e apresenta-los o evangelho como a qualquer outro pecador?
“Aceitando” a homossexualidade
Se pegarmos o sentido literal da palavra “homofobia”, talvez eu até a pudesse usar para nossa realidade na igreja. Creio que muitos cristãos tem um tipo de medo de receber homossexuais justamente por não saber como proceder corretamente. Nesse sentido, penso que precisamos “aceitar” a homossexualidade em nossas igrejas. Não como Eugene Peterson, mas como pessoas que estão perdidas sem Deus e precisam do evangelho. Há lugar melhor para um pecador, homossexual ou não, estar do que na igreja? Não. Algumas verdades podem nos ajudar nessa “aceitação”:
- A nível de salvação, o pecado da homossexualidade é como qualquer outro pecado. Ele, por si só, condena qualquer pessoa, mas pode ser redimido pela obra de Jesus Cristo (Ef 2:1). Nesse sentido não há pecadinho e pecadão. Se você é homossexual ou tem tentações homossexuais, leia essa carta que escrevi: Carta de um calvinista a uma jovem com tentações homossexuais.
- A pregação do evangelho é para toda a criatura e não há nenhuma restrição em virtude de pecados ou condição de vida (Mc 16:15). A normalidade é a via de regra nesses casos.
- Um cristão verdadeiro pode lutar contra suas tentações homossexuais. Assim como outras tentações não desaparecem obrigatoriamente instantaneamente, não devemos esperar que aconteça o mesmo com a atração pelo mesmo sexo. Cada caso é um caso. Há um vídeo entrevista muito bom do Voltemos ao Evangelho falando sobre isso: Um cristão pode ser gay? Ou ter atrações homossexuais?
Se entendermos essas verdades poderemos resolver de forma mais fácil a tensão que falei acima. Como eu disse, a normalidade é a via de regra quando tratamos com homossexuais que precisam ouvir o evangelho. Coloco aspas no aceitar porque não aceitamos o pecado, mas aceitamos o desafio de pregar o evangelho normalmente ao pecador.
“Rejeitando” a homossexualidade
Existem pecados, que pela natureza e consequência são mais difíceis de lidar e tratar (veja Romanos 1 sobre a homossexualidade). Nesse sentido acredito em pecadinho e pecadão, mas esse é assunto para um outro momento. Mesmo assim, o que quero propor fará sentido até para quem não vê diferença essa diferença entre os pecados.
Geralmente escuto o argumento: “falam contra a homossexualidade, mas a igreja é cheia de outros pecados. Quase sempre estão falando da não aceitação da relação homossexual. Permita-me uma comparação então. Pense num homossexual que está namorando e num homem que se ira facilmente. Ambos são pecadores e estão errados. Agora pense que eles se convertem verdadeiramente ao senhor Jesus. Uma das grandes ações de um regenerado é o abandono do pecado (leia Rm 6). Mesmo que ainda haja tentações e quedas, o crente verdadeiro foge do pecado.
O homem irado lutará contra sua ira. As tentações podem continuar, mas ele cultivará um espírito manso e controlado. Deus o ajudará para que a Ira se torne em mansidão. De maneira nenhuma ele baterá no peito e dirá: “sou irado mesmo e assim continuarei, vocês terão que me aceitar como eu sou!”. Creio que todos os cristãos concordem com isso. Porque então seria diferente com o homossexual. Porque a igreja sofre pressão para aceita-lo do jeito que ele é? Um homossexual que se converte passará a ser um ex-homossexual lutando contra suas tentações para deixar seu pecado. Novamente, a normalidade é a via de regra. Pecadores convertidos lutam no poder do Espírito para abandonar seus pecados. É a ordem de Deus para seu povo (1 Pe 1:16; Hb 12:14) Como fugir do pecado e ainda estar num relacionamento com alguém do mesmo sexo?
É por isso que a igreja deve “rejeitar” os relacionamentos homossexuais entres seus membros. É por isso que não há possibilidade bíblica de líderes eclesiásticos homossexuais. Membresia e liderança são exclusivos de pessoas regeneradas e verdadeiramente cristãs. E lembre-se do que eu disse. Há cristãos com tentações homossexuais, mas não cristãos homossexuais. Coloco aspas no “rejeitar” porque não rejeitamos a presença de pecadores não arrependidos entre nós, mas rejeitamos o amor e convívio normal com o pecado entre os cristãos.
Homossexualidade na igreja. O que fazer?
Em linhas gerais, como você percebeu, meu argumento principal sobre como agir com o pecado da homossexualidade é a normalidade. Não a normalidade que trata o pecado como normal e aceitável, mas que trata o pecado homossexual com a via normal e única que a Bíblia nos ordena. Não aceitando por completo, mas “aceitando” e nem rejeitando por completo, mas “rejeitando”. A igreja precisa tratar a homossexualidade com normalidade, não como normalidade. Quando caímos nos extremos nos tornamos incapazes de demonstrar a pureza da graça soberana de Deus. Ela só é graça porque salva pecadores. O movimento da graça é de “rejeitar” (não merecemos) e de “aceitar” (recebemos). Veja Romanos 3:23-25.
“A igreja precisa tratar a homossexualidade com normalidade, não como normalidade”
Em linhas práticas eu seguiria os passos normais de uma igreja. Pregação e discipulado (Mt 28:18-20). Pregue a Palavra de Deus e o evangelho em sua totalidade diante de visitantes homossexuais. A igreja precisa ter cuidado para não criar um ambiente hostil a qualquer tipo de pecador. Um casal homossexual precisa se sentir bem recebido e bem confrontado assim como todos nós pecadores. Se Deus os chamar e eles se converterem, parta para o discipulado e mostre que a igreja está disposta a lutar junto na batalha contra o pecado. Não cobre uma aniquilação instantânea das tentações, mas uma luta ferrenha contra esse e outros pecados. Enfim, cumpramos normalmente a ordem que Jesus Cristo nos deu. Lembre-se sempre que conversão e santificação são obras soberanas de Deus, e que tudo será feito no tempo e no jeito dele, para sua própria glória!.
Indico a leitura do livro O Que a Bíblia Ensina Sobre a Homossexualidade de Kevin De Young e publicado pela Editora Fiel.
Pedro Pamplona é casado com Laryssa e formado em administração pela Faculdade 7 de Setembro (Fortaleza/CE), pós-graduado em Estudos Teológicos pelo Centro Presbiteriano Andrew Jumper (São Paulo/SP) e estudante do Sacrae Theologiae Magister (Th.M) em Teologia Sistemática do Instituto Aubrey Clark (Fortaleza/CE). Serve integralmente como líder de jovens na Igreja Batista Filadélfia, em Fortaleza.