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Foram 10 anos entre o dia em que comecei a desejar ser pastor até o dia da minha ordenação ministerial. Foi uma longa caminhada entre bons e maus momentos; entre erros e acertos; entre dúvidas e certezas. Não foi uma grande história cheia de fatos extraordinários, mas uma história comum de um jovem comum. Nisso está a relevância dela. É uma história normal da vida que pode gerar identificação e lições para o leitor comum. Passei por algumas situações e dilemas que geralmente estão presentes na jornada até o ministério e exponho aqui parte da minha vida na esperança de que você encontre um pouco de incentivo, consolo e sabedoria através daquilo que Deus fez comigo.

Dividi a minha jornada em cinco fases (descoberta, empolgação, dúvida, renovação e consolidação). Essas não são fases obrigatórias de toda jornada ao ministério, são apenas a melhor forma que encontrei para explicar a minha. Creio, porém, que é uma boa divisão para você pensar e agir. No mínimo você passará por três delas (descoberta, empolgação e consolidação), embora eu creia que a maioria passará pelas cinco. Portanto, leia e reflita sobre o que você pode aprender sobre cada fase dessa excelente jornada ao ministério pastoral.

Fase da descoberta 

Tudo começou quando eu tinha dezessete anos. Lembro de uma pregação do meu pastor, na época, que quebrou meu coração frio e orgulhoso. Ele falou sobre a graça de Deus num retiro de adolescentes e ali fui impactado pela mensagem do evangelho. De um adolescente frio e desinteressado, passei a ser um leitor faminto da Bíblia e de boa teologia. Queria aprender a verdade e conhecer mais sobre Deus. Hoje percebo que desde aquele momento Deus estava me preparando para o ministério. Como produtor de conteúdo online, quero destacar o papel fundamental que a internet teve na minha descoberta do chamado. Foi através de textos e vídeos de blogs como o Voltemos ao Evangelho que meu coração foi despertado para o desejo pastoral. Minha maior influência foi John Piper. Vendo-o pregar desejei ser um pregador. A forma bíblica e apaixonada de Piper pregar me cativou e me incentivou a pregar a palavra de Deus. Nascia ali o meu desejo de ser um pastor. Eu queria pregar e alimentar o rebanho de Deus. O desejo pastoral começou pelo desejo da pregação.

Eu tenho essa noção hoje, mas na época não era tão claro assim. Quando comecei a desejar a pregação e considerar o ministério pastoral, eu não tinha certeza acerca do meu desejo. Eu não tinha parâmetros para avalia-lo. Eu sequer sabia como as coisas funcionavam. É normal desejar isso? Será que não é mais uma das minhas ideias passageiras? Essa foi a minha primeira dificuldade. O desejo pastoral é algo para o qual nós não nos preparamos e nem somos preparados. Tudo é novidade quando se sente o chamado. O que fazer então nessa fase de descoberta? O livro A Jornada Excelente foi escrito especialmente para quem está nessa fase.

Converse também com seu pastor sobre o desejo. Eu sei que parece estranho dizer para alguém que você quer ser um pastor, mas lembre-se, isso é normal, esperado e louvável. A grande maioria dos pastores fica feliz em saber que um jovem da sua igreja deseja o ministério. Ter uma boa conversa com quem já passou pela jornada é uma ótima forma de entender mais sobre o seu desejo. Isso é fundamental nesse momento de descoberta.

Outro problema que tive foi a timidez. Ainda o enfrento na verdade, mas era bem pior nessa fase. Eu era aquele aluno que segura o cartaz na frente do rosto nas apresentações de trabalhos da escola. Sempre tive dificuldade de comunicação e interação social.  Nunca me imaginaria pregando para muitas pessoas. Acho que ninguém imaginaria. Pregar e liderar uma igreja parecem funções bem distantes e praticamente impossíveis diante da timidez. Mas aqui está a boa notícia: tem jeito! Acredite, se Deus me ajudou a superar boa parte dessa timidez, ele pode fazer isso com você também. Permita-me apenas contar três meios que ele usou para isso. Ele fez isso comigo através do ministério infantil, que quebrou meus obstáculos da timidez; do estudo aprofundando, que me deu mais segurança; e da experiência de pregar em praça pública; que me deu jogo de cintura para falar em público.

Fase da empolgação

Seu desejo pastoral te levou a estudar e servir à igreja. Agora você já está ensinando em algum nível ou até pregando. Tudo parece ir muito bem e você está gostando, se aprofundando e se esforçando cada vez mais. Essa é a fase da empolgação, uma ótima fase, diga-se de passagem. Não entenda como se a empolgação pelo ministério fosse passar depois dessa fase. Sou extremamente empolgado até hoje! Estou me referindo aqui àquela empolgação inicial do início da jornada. Sobre ela, quero dar um conselho prático positivo e alertar sobre dois perigos que rondam o seu coração.

O primeiro conselho positivo é que você deve aproveitar o momento. Lembro de me sentir empolgado para o ler o máximo possível, servir à igreja com diligência e aproveitar todas as oportunidades de pregação. Além de me debruçar sobre a Bíblia para aprender direto da fonte, lembro de ter lido toda a teologia sistemática intermediária de Wayne Grudem de capa a capa. Eu queria aprender mais para ensinar mais! Se você está nessa fase, aproveite para comprar livros e lê-los, sempre com responsabilidade financeira, claro. Faça isso principalmente se você for solteiro e já estiver trabalhando. Eu comprei muitos livros na época, mas deveria ter comprado mais. Depois do casamento e do filho, não posso mais comprar tantos como eu poderia na época. Este é meu conselho positivo, aproveite a empolgação, tempo e recursos para se preparar muito bem!

Agora preste muita atenção para os perigos que rondam o seu coração. O primeiro deles é externo, são as pessoas que cortarão sua empolgação e até o seu desejo. Geralmente, jovens que se dedicam a estudar e ensinar teologia são rapidamente reconhecidos nas igrejas. Com isso, algumas pessoas levantarão algumas objeções contra você, seu desejo, seus estudos e serviço. Algumas pessoas fazem isso com boas intenções, mas acabam errando. São os casos de pessoas que tentam avisar sobre o perigo do orgulho e busca pela fama. Outras pessoas fazem por falta de conhecimento e sabedoria. É o caso de pessoas que nos acham muito novos para pregar ou pensar em sermos pastores. E existem outras pessoas que fazem por pecado. É o caso de pessoas que invejam seu reconhecimento e querem parar o que você está fazendo.

Você precisa discernir bem cada um desses tipos de objeções. Eu, por exemplo, ouvi muito a do primeiro tipo. Pessoas com boas intenções estavam tentando me ajudar, mas acabavam mais atrapalhando. Elas sempre estavam falando de orgulho e necessidade de aparecer. Isso até tinha o seu fundo de verdade no meu caso, mas ficar sempre batendo nessa tecla corta a empolgação e esfria o desejo de qualquer um. O conselho é ouvir e refletir sobre seus desejos, sem deixar que a repetição te deixe desempolgado. Saiba que a maiorias das pessoas faz isso pensando no seu bem. Tenha misericórdia delas quando errarem. Nos outros dois casos tenha paciência, respeite as pessoas, mas não dê ouvidos a esses erros. Lembre-se de que seu compromisso é com Deus e com sua igreja local, representada pelos líderes e toda a congregação. Não deixe que uma minoria esfrie o seu desejo.

O segundo perigo é interno. É o seu orgulho. Mesmo que algumas pessoas errem ao falar disso, essa tentação é real. O reconhecimento natural das pessoas é ótimo, mas pode trazer um sentimento de superioridade. Muitas vezes me peguei pensando ser superior a outros jovens que não estudavam como eu e que não pregavam. Me peguei numa competição mental sobre quem seria o melhor pregador. Eu ou fulano? Isso é terrível. Precisamos nos proteger desses pecados com muito oração e confissão. A maturidade e o tempo servindo à igreja nos ajudam muito nisso, mas é preciso cortar as asas da arrogância logo cedo. Não deixe esse pecado tornar a bênção do seu desejo em maldição. O orgulho corrompe até os corações mais bem intencionados. Hoje me vejo em mais santidade nessa área, mas sempre cuidando para não cair.

Fase da dúvida

Aqui está uma fase que talvez nem todos passarão, mas creio que a maioria sim. A dúvida nos persegue até a ordenação ministerial e algumas vezes até após ela, mas aqui falo da fase de grande dúvida sobre o desejo e o chamado ministerial. Falo da fase em que pensamos seriamente em desistir da jornada. Eu passei por ela, e foi um momento marcante na minha vida. Saber passar por essa fase é um grande passo para a chegada ao ministério. Deus trabalha intensamente nesse momento. Eu sofri com três fatores de dúvida que, talvez, sejam os principais e mais comuns: tempo, falhas e pressão.

A dúvida do tempo acontece quando ele avança e não traz consigo oportunidades e reconhecimento formal da igreja. Você vê os anos passando e parece que o ministério pastoral é sempre uma realidade distante. Muitos seminaristas lutam com essa falta de perspectiva. Esse futuro incerto e por vezes vazio abate a empolgação e nos tenta a desistir. A solução é confiar e depender de Deus. O chamado é divino e depende de sua soberana vontade. Ser um pastor não está em suas mãos, entenda isso. Entenda também que cada estrada é diferente. Umas mais curtas e outras mais longas. Nunca queira caminhar pisando em cima das pegadas de outros pastores, Deus tem um caminho específico para você. Não pense em desistir por comparar estradas.

A dúvida das falhas acontece pelo julgamento que fazemos de nós mesmos. Com o amadurecimento e oportunidades de serviço, liderança e pregação durante a fase de empolgação, vamos percebendo nossas falhas, imperfeições e incapacidades. Isso é normal. O jovem que se acha um grande candidato começa a ver que ele não é tão bom quanto pensa. A realidade é dura com nosso ego. Essa disparidade entre quem eu penso que sou e quem eu estou percebendo que sou nos leva a pensar de nós mesmos como inapropriados para o ministério. Aqui vão dois conselhos básicos sobre isso. Primeiro, não pense de forma elevada demais sobre si mesmo. Isso realmente pode te decepcionar quando o espelho da vida revelar quem você é realmente. Segundo, não pense de forma apequenada demais sobre Deus. Se ele te chamou, ele te capacitará a exercer bem o ministério pastoral.

A dúvida da pressão é causada pelas expectativas criadas em torno de nós. É uma dúvida cruel. Quando você passar a estudar, ensinar, pregar e servir, as pessoas normalmente reconhecem e projetam um futuro promissor para sua vida. Você passa a ouvir coisas do tipo: “você será nosso futuro pastor” ou “confiamos em você para nos pastorear no futuro”. Esse é um ótimo sinal, mas também gera uma carga enorme em nossos ombros. A carga é tão pesada que passamos a temer a jornada. Não queremos decepcionar essas pessoas e achamos que pode ser melhor desistir logo e não frustrar ninguém. Aqui eu quero te exortar. Esse é o momento de ser homem! É preciso ter as costas largas para suportar essa pressão e assumir responsabilidades. Ter medo de frustrar as expectativas próprias e de terceiros geralmente é um problema de orgulho, medo de ferir sua reputação.

Quando passei por isso, lá no fundo eu não estava tão preocupado em frustrar as pessoas, mas em como ficaria minha imagem diante delas. Eu seria aquele que correu atrás de um sonho e fracassou. Triste pensamento. Mas uma vez também faltava descansar na soberania de Deus. É um paradoxo que enfrentamos: cremos que o chamado ao ministério é divino, mas queremos resolver tudo e chegar lá pela via humana. Portanto, não caia nessa de ficar criando desculpas para desistir ou para não assumir as responsabilidades das expectativas. Essa capacidade de lidar com a pressão é fundamental para um pastor e é um dos grandes indicadores que a igreja tem para saber se pode ou não confiar em você. Seja homem! Seja humilde e dependente de Deus.

Fase da renovação

Foi a igreja que tirou essa dúvida mortal do meu coração. Foi ela que me manteve na estrada. Pessoas que reconheciam em mim o caráter, os dons, amor e desejo para o ministério salvaram minha jornada. Geralmente a renovação dura um certo tempo. Ela está mais para um processo do que um acontecimento único. A minha durou alguns meses e me ajudou muito a chegar até o final. Aqui fica a lição para essa fase: na hora da dúvida precisamos recorrer à nossa igreja local. É ela, seja pela liderança ou por outros irmãos, que dirá “continue” ou “talvez seja melhor parar”. Uma boa igreja será sábia para isso. Nunca desista do ministério sem consultar seu pastor, líderes e amigos. Eu quase fiz isso. Abaixo quero listar algumas atitudes que você pode tomar para renovar o seu chamado. Antes, claro, nunca esqueça de orar constantemente e fervorosamente sobre isso. Fale com Deus e peça que ele aqueça o seu coração. É nesse momento que devemos crer no poder sobrenatural de Deus.

Renove seu desejo por meio de amizades com pastores e outros jovens que desejam o ministério. Sua igreja e o seminário são ótimos lugares para conversas santas sobre seu coração. Peça que pastores compartilhem seus testemunhos e falem sobre as alegrias da vida pastoral. Todo pastor que conheço adora falar sobre isso. Renove seu desejo por meio da leitura. Existem excelentes livros sobre o ministério pastoral que servem como uma injeção de ânimo. Ler e refletir nesse tipo de material pode ser um grande refrigério para o seu coração. Um bom livro pode ser aquele sopro de consolo e ânimo para sua alma. Aqui quero indicar o livro Amado Timóteo, publicado pela Editora Fiel. O livro foi editado por Tom Ascol e trata-se de uma coletânea de cartas de pastores mais experientes a um novo pastor imaginário. São cartas que você deve ler como se tivessem sido escritas para você. É um livro muito bom para nos apresentar melhor o ministério pastoral e fortalecer nosso desejo.

E em terceiro lugar, renove seu desejo pensando naquelas igrejas que não têm pastor. Certa vez Jesus se compadeceu da multidão porque as pessoas eram ovelhas sem pastor (Mt 9:36; Mc 6:34). Ele passou então a ensina-las até tarde. Lembre que essa é uma situação triste e real nos dias de hoje. Existem igrejas sem pastor e igrejas que ficarão sem pastor. Lembre-se que a seara é grande, mas poucos são os trabalhadores (Mt 9:37). Sua cidade, estado e país precisam de mais pastores. O mundo precisa! E você pode ser mais um para ajudar nesse enorme campo. Tenha compaixão dessas ovelhas! E se isso aquecer seu coração já é um grande sinal que você está no caminho certo para o ministério. Um verdadeiro pastor não suporta ver ovelhas sem cuidado e proteção. Que esse sentimento inflame seu coração!

Fase da consolidação

A fase da dúvida tem um propósito importante em cada jornada. Ela serve como um filtro. Em meio aos dilemas e dificuldades da estrada, aqueles que não possuem um desejo real e convicto tendem a desistir. Muitas vezes alguns jovens se iludem pelo ministério e entram na jornada sem um coração profundamente desejoso. A dúvida revela isso e não há nenhuma vergonha em perceber e dizer “isso não é para mim”. Deus usa esse momento exatamente para isso. Por outro lado, o jovem que possui o verdadeiro desejo persevera na convicção do seu chamado. Ele aprenderá com essa fase difícil e amadurecerá o seu desejo. Quando a renovação acontece na vida desses jovens a estrada fica mais clara e os passos mais certos. É isso que chamo de fase da consolidação.

Depois da fase da dúvida meus passos começaram a ser acompanhados e ganhei uma orientação pastoral constante que nunca tive. Tudo isso consolidou o desejo do meu coração e refletiu nas minhas ações. Eu estava numa fase mais segura. Na fase em que minha convicção do desejo e a esperança do chamado já não eram mais tão atrapalhadas por medos, dúvidas e ansiedade. Não me sentia totalmente preparado para ser um pastor, mas me via no caminho certo. Estava agindo para ser um e deixando o futuro ministerial nas mãos de Deus. Foi um ótimo tempo. O amadurecimento da jornada nos dá mais convicção e segurança, o que gera mais reconhecimento por parte da igreja. Esse reconhecimento, por sua vez, gera mais convicção e segurança. É um ciclo excelente para todo candidato ao ministério estar.

É o momento de desenvolver mais e consolidar a imagem, caráter e aptidões de um pastor. Pregue, ensine, aconselhe, converse, tenha comunhão, visite, seja hospitaleiro, limpe a igreja e demonstre amor pela congregação local. Tudo isso sem forçar a barra e sem exibicionismo. Seja moderado nessas coisas e deixe a igreja perceber seu zelo naturalmente. É nessa fase de pré ordenação que você precisa deixar a igreja confiante que reconhecer você como pastor é o certo a se fazer. Para isso ela precisará perceber seu perfil pastoral e sua capacidade de pregar. Dedique-se a isso!

Conclusão

As jornadas ao ministério possuem muitas semelhanças e podem ser representadas por essas fases. Identificar seu lugar na estrada é uma ótima forma de saber o que fazer agora e daqui para frente. Um dos grandes conselhos do livro é o seguinte: a jornada excelente não pode ser vivida em isolamento. É fundamental contar com pastores e líderes mais experientes em todas essas fases. É deles que virá encorajamento bíblico, aconselhamento e correções. Um jovem caminhando nessa estrada sozinho é uma presa fácil para o diabo transformar o desejo pastoral numa ferramenta de destruição de igrejas. Lembre-se de que toda grande jornada precisa de companheiros. Todo Frodo precisa de amigos como Sam, Aragorn e Gandalf.

* Esse texto é o resumo do capítulo 4 do livro A Jornada Excelente, escrito para jovens que desejam o ministério pastoral. Você pode comprar clicando aqui.

Pedro Pamplona é casado com Laryssa, pai do Davi e pastor na Igreja Batista Filadélfia, em Fortaleza. Estudante doSacrae Theologiae Magister (Th.M) em Teologia Sistemática do Instituto Aubrey Clark (Fortaleza/CE). |Instagram| |Twitter|

 

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